quinta-feira, 30 de junho de 2016

A vida é muito curta para morar no Rio

Reproduzo abaixo o texto de Mariliz Pereira Jorge publicado hoje na Folha. A verdade pode doer, mas não deixa de ser verdade.

A vida é muito curta para morar no Rio

30/06/2016 

Eu era a paulista mais carioca que meus amigos conheciam. Tinha a tal alma, roupas coloridas, conta na barraca do Leandro, no Posto 12, mesa cativa no Jobi, chamava os garçons pelo nome, tomava cerveja na calçada, banho de mar à noite no verão. Estava com uma mala sempre pronta, e a poltrona 8F no avião religiosamente reservada para ver lá de cima a cidade chegando.

A vida é muito curta para não morar no Rio, diziam. Eu ria, mas voltava feliz para o meu caos organizado em São Paulo, às segundas pela manhã. Até que uma proposta de trabalho me trouxe de mala e mudança. Depois do primeiro mês, a lua de mel com a cidade acabou e eu me perguntava: como as pessoas moram aqui?

Demorou, mas não sou mais solitária nesse questionamento. Vejo amigos e conhecidos compartilhando em redes sociais uma pesquisa feita pela ONG Rio Como Vamos, que mostra que 56% da população tem vontade de ir embora da cidade. Em 2011 esse percentual era de 27%.

O que faz os moradores quererem fazer as malas é o aumento da violência. Roubos na rua assustam mais as classes mais altas, enquanto as balas perdidas são o terror na vida da população menos favorecida. Mas os problemas do Rio vão muito além disso, e é um espanto que apenas tiro, porrada e bomba tenham acendido o alerta de que a Cidade Maravilhosa é uma farsa. Uma paisagem espetacular, recheada de problemas escandalosos.

Essa visão de que o Rio é o melhor lugar do mundo para se viver é um tanto provinciana e romântica, além de cega, de uma maioria que mora e trabalha na zona sul –e parte da zona oeste– e só de vez em quando tem o doce cotidiano chacoalhado pela violência que atravessa o túnel Rebouças. Gente que vive numa bolha, que eventualmente estoura num assalto com morte.

Vida que segue. A gente se deslumbra com a belezura da geografia e aprende a conviver com malandragem generalizada, falta de pontualidade, incompetência disfarçada de informalidade, hostilidade travestida de espontaneidade, infâncias miseráveis, pobreza, falta de tudo.

O Rio é só uma cidade decadente que vive de um glamour passado, num presente melancólico. E parte da sua população sempre foi conivente com tudo que nos fez descambar para essa triste realidade. Como fechar os olhos para uma parte gigante da cidade que apenas sobrevive?

Praias, lagoas e baía não ficaram poluídas da noite para o dia. Ainda assim, as areias estão sempre cheias, mesmo nos dias em que o mar não está nem para peixe nem para gente. O negócio é mergulhar no cocô para se refrescar, tomar uma cervejinha e tirar foto do pôr do sol. Com sorte, daqui uns anos ainda reste o pôr do sol.

Chamar favela de comunidade não muda o fato de que centenas de milhares de pessoas continuam vivendo sem saneamento, sem saúde, sem educação, reféns ora do tráfico ora da milícia. Mas é bonito subir o morro, ir ao sambinha, postar foto na "comunidade" e fazer de conta que ela está integrada. Não está. Fica bonito na letra de música, na poesia, mas é apenas gente esquecida –e tolerada– em troca de status de cartão postal.

Mas tudo bem, a gente dá uma maquiada, ergue muros nas linhas Amarela e Vermelha para que os turistas não vejam o lado mais feio, miserável e perigoso da cidade –além de evitar que balas atravessem a pista e matem os desavisados. De quebra, nós mesmo esquecemos que existe o lado mais feio, miserável e perigoso por onde só passamos a caminho do aeroporto.

O coro de "nunca pensei que diria isso, mas penso em ir embora do Rio", tomou o lugar de posts babaovistas com legenda "Rio, eu amo eu cuido", "Eu moro onde as pessoas passam as férias". Férias é somente o que uma pessoa com juízo faria aqui. Vem, passa o dia na praia, torce para não ser vítima de um arrastão, passeia pelos pontos turísticos, toma um chopp aguado, come um bolinho no Braca, vai no ensaio da escola de samba, se o tráfico não estiver em pé de guerra, pega o avião a vai embora.

Para quem mora aqui, o jeito é torcer. O que nem sempre é suficiente. Para muita gente a vida tem sido muito curta para morar no Rio. Juan, um ano e dois meses. Giselle, 34. José Josenildo, 31. Foram mortos nas últimas semanas. Bala perdida. Tentativa de assalto. Emboscada. Não há paisagem que valha a pena morrer tão cedo.

Obviamente, criminalidade, pobreza, corrupção e falta de toda a sorte de serviços básicos são problemas em maior ou menor grau em todas as capitais brasileiras, mas nenhuma se vende como Cidade Maravilhosa. E antes que algum ofendido venha me mandar embora, só tenho uma coisa a dizer: é o que eu mais quero. Eu e os 56% dos moradores do Rio.

Debaixo da toga

A nação suspeita, há muito tempo, que vários ministros do Supremo usam a estrela do PT por baixo da toga. E, de vez em quando, essas suspeitas são corroboradas por atitudes, no mínimo, duvidosas desses ministros.

O ministro Lewandowski, não bastasse sua atuação francamente pró PT no julgamento do mensalão, ainda se prestou a manter encontro secreto com Dilma em Portugal, um despropósito total, para dizer pouco. O ministro Marco Aurélio, que até então só era um chato de galocha, depois que sua filha foi nomeada pela ex-presidente para um cargo vitalício com salário monumental, virou petista de carteirinha desde a infância. Foi ele quem inventou a figura do impeachment de vice.

O ministro Barroso não procura nem tentar disfarçar. Sua atuação no episódio da eleição da comissão do impeachment, que foi anulada, deixou de modo cabal e explicíto o viés ideológico, quando omitiu dolosamente a parte do texto que não lhe interessava, ao ler um trecho do Regimento Interno da Câmara. E o ministro Dias Tóffoli, ex-advogado do PT, continua a exercer essa função sob a toga negra, sempre que precisam dele.

Sua decisão de mandar soltar um sujeito que desviou e roubou dinheiro de aposentados, dando a esse bandido a possibilidade de atuar na ocultação dos valores roubados, foi uma decisão que ainda pertence ao país que está acabando e que queremos ver morto e enterrado. 

É preciso repudiar com veemência atitudes como essa que não cabem mais no Brasil de hoje. Ainda somos um país atrasado, ainda temos muito a fazer para merecermos o título de país civilizado, mas um passo importante foi dado nessa direção desde 2013. Não há como retroceder.


terça-feira, 28 de junho de 2016

BREXIT

Por que é que a saída do Reino Unido da União Européia será o caos? Não concordo com essa tese. A história britânica mostra que eles nunca se sentiram muito confortáveis com relação à Europa em geral. 

Sendo uma ilha, conseguiram manter-se sempre a certa distância do que acontecia no continente. Primeiro foi a Espanha que tentou de todas as maneiras dominar e comandar os britânicos, até que a famosa esquadra de Filipe II, a Invencivel Armada, composta de 130 embarcações,  não conseguiu superar as ações de Sir Francis Drake, um corsário, e naufragou em uma tempestade quando tentava invadir a Ilha.

Foi nesse momento, sob o reinado da outra Elizabeth, que a Inglaterra (e depois o Reino Unido) tomou as rédeas do próprio destino, o que a tornou, mais tarde, um império maior que a própria Espanha.

Desde a união das coroas sob James Stuart (I da Inglaterra e IV da Escócia) até 1973, os britânicos viveram "fora" da Europa. Após a II Guerra, o império, que se desmanchava, criou a Commonwealth, a primeira grande comunidade de nações, que passou a existir sem nenhum vínculo especial com a Europa.

O sonho de uma união europeia foi um sonho muito mais francês que britânico. Isso era, inclusive, o grande plano de Napoleão: unir a Europa, mas deixar os britânicos de fora, contra os quais decretou o Bloqueio Naval, causa indireta da independência do Brasil, como consequência da fuga da família real portuguesa para cá.

Em resumo: a Inglaterra sempre olhou para o Continente com muita desconfiança.  A União Europeía não conseguiu nesses 43 anos, mudar esse estado de espírito. A saída era natural nesse caso, em especial, quando, para os britânicos, o ônus de participar de uma união tão desigual estava se mostrando maior que os bônus. Um exemplo: o sistema de saúde britânico, público e universal e um motivo de orgulho para a nação, estava perdendo recursos para subsidiar o sistema de saúde europeu, leia-se, para subsidiar o sistema de saúde dos gregos. O mesmo se pode dizer das aposentadorias. O Welfare State foi simplesmente demolido. E a imigração, à qual os ingleses já estavam acostumados, dadas as suas relações com a Commomwealth, se tornaram, de repente, um fardo, pois uma coisa é aceitar imigrantes da India ou da Jamaica, que estão culturalmente adaptados aos padrões britânicos. Outra coisa é ter que receber, à força, imigrantes cuja cultura nada tem a ver com a cultura local e ainda podem ser uma ameaça, como ocorreu na França, Bélgica e Holanda. Isso pode parecer egoísta e anti-humanitário, mas essa questão da segurança afeta a todos. Ser humanitário pode ser bonito no papel, mas, quando seu filho pode ser explodido por uma bomba, a coisa muda de figura.

O fato é que a União Européia não conseguiu convencer os britânicos que era melhor ficar. E eles exerceram seu direito de escolha. Respeitemos!

PS- Para o Brasil isso pode ser uma vantagem. É o momento de procuramos acordos comerciais com o Reino Unido.

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