quinta-feira, 22 de novembro de 2018

Geleia geral (2)

Como acontece frequentemente, os artistas tem uma visão que, muitas vezes, antecipa o futuro. Assim, o conceito da geleia geral, como descrição da meleca cultural na qual vivemos agora, foi, de certo modo, antecipado pelos tropicalistas.

Como chegamos a isso? Como involuímos da bossa nova para o rap, do conceito de pátria ao conceito de mátria (conforme Caetano), aquela de tetas inesgotáveis, a vaca profana (de novo, Caetano) dos nossos dias?  Da língua de Camões, para a língua dos surfistas?

Acho que a resposta é simples. Segundo C. G. Jung, a civilização é apenas uma camada de verniz muito tênue aplicada em cima de um brutal substrato bárbaro e animal e que, por qualquer motivo, ou descuido, à barbárie retornamos num piscar de olhos. Basta ir a um jogo qualquer em um estádio para comprová-lo! Por qualquer motivo, o grupo, supostamente civilizado, se transforma rapidamente em uma horda de vândalos.

Manter as conquistas civilizatórias exige muito esforço e um grande dispêndio de energia. Isso se chama EDUCAÇÃO! O processo educativo é um processo anti-entrópico e portanto exige esforço e investimento permanente de energia para se manter. Em outras palavras, é muito mais fácil destruir que construir; o caos se instala por si só, basta não fazermos nada.

Sociedades, porém, que estejam em risco, quer por falta de alimentos, ou por estarem submetidas a ditaduras ou ao crime organizado, não dispõem de recursos para investir na educação. Nessas sociedades, a regressão à barbárie se dá em poucos anos, ou meses. Mesmo em sociedades que aparentemente conseguem manter um certo padrão civilizado, como é o caso do Brasil, formam-se bolsões de barbárie localizados em áreas onde o Estado não esteja presente.

A linguagem, ou a deterioração dela, acaba por ser o sinal mais evidente dessa regressão. O vocabulário decai, a sintaxe simplifica-se, a possibilidade de nuances de expressão ou de pensamento desaparece.

É nesse contexto que se instala a geleia geral: uma mistura amórfica de conceitos misturados, ouvidos aqui e ali, retalhos culturais costurados aleatoriamente e sem qualquer projeto. Se daí sairá algo que preste, só o tempo dirá.  Tomando como exemplo a música popular brasileira, sabemos que involuímos da bossa nova para a tropicália, daí para o rock made in Brasil, depois para o hip-hop, o rap e chegamos à Jojô Toddynho: "Que tiro foi esse, viado? Quer causar, a gente causa. Quer sambar, a gente pisa. Quer causar a gente causa; quem olha o nosso bonde pira."


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