Prepare o seu coração pras coisas que eu vou contar
Eu venho lá do sertão, eu venho lá do sertão
Eu venho lá do sertão e posso não lhe agradar
Aprendi a dizer não, ver a morte sem chorar
E a morte, o destino, tudo, a morte, o destino,tudo
Estava fora de lugar, eu vivo pra consertar
Na boiada já fui boi, mas um dia me montei
Não por um motivo meu,
ou de quem comigo houvesse
Que qualquer querer tivesse,
porém por necessidade
Do dono de uma boiada cujo vaqueiro morreu
Boiadeiro muito tempo, laço firme, braço forte
Muito gado, muita gente pela vida segurei
Seguia como num sonho
em que o boiadeiro era um rei
Disparada - Geraldo Vandré
Dentre todas as coisas esquisitas, suspeitas, maliciosas, ridículas, hilárias, cômicas e vergonhosas, desse julgamento do TSE, destaca-se uma pela bizarrice: o gesto do ministro Napoleão pedindo que a ira do Profeta caia sobre seus desafetos e lhes corte as cabeças!
Citou, supostamente, um trecho do Alcorão e formulou o desejo que as cabeças, dos que considera inimigos, sejam cortadas. Parecia um aiatolá em fúria!
Eu me perguntei se, acaso vivêssemos em um regime que desse tal poder a esse homem, não haveriam mesmo cabeças rolando. Haveriam! Podem ter certeza!
Pois em plena democracia, em um país majoritariamente cristão, esse homem, um juiz de um Tribunal Superior (que até parece ser evangélico), não um cangaceiro de Limoeiro, pedia de público a ira do Profeta (e ainda esclareceu, para quem tivesse dúvida, que se tratava do Profeta Maomé) e a degola, pura e simples, dos seus "inimigos", o que se poderia esperar se tivesse à sua disposição a Sharia e o fanatismo dos seguidores?
A que ponto chegamos? Esse gesto do Napoleão de Limoeiro sequer causa impressão. Foi mencionado "en passant" na mídia e pronto. Seus colegas ouviram em silêncio. Mesmo quem não concordasse não teve coragem de levantar a voz em protesto.
Isso demonstra que essa gente saiu das grotas, passou um verniz, vestiu uma toga, mas não deixou para trás os cacoetes de senhores de engenho. Pensam que ainda são coronéis, oligarcas, cuja vontade é absoluta, que tem poder de vida e de morte sobre seus súditos e não podem jamais ser contrariados, menos ainda contestados.
O Brasil está assim porque essa mentalidade de país agrário atrasado ainda está entranhada na cabeça e no comportamento da classe política dirigente. Estamos no século XXI, mas na cabeça deles ainda não saímos do XIX. Sejam esses políticos de aparência moderninha, como um Aécio, ou antiquada mesmo, como um Napoleão e um Gilmar Mendes, a mentalidade que os guia é a do "dono de gado e gente".
E, infelizmente, até mesmo quem fazia parte do gado, quando "um dia se montou", resolveu também virar senhor de engenho. Como o poder é inebriante!
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